“O padre é uma criação do amor infinito de Cristo, para continuar a sua obra, para ser o homem de Deus e o homem das almas. É homem de Deus: para tal, tem de ser um homem todo de Deus. É homem das almas: a sua família são as almas e, por isso, as principais funções do seu ministério vão ao encontro das maiores necessidades das almas”. (ArqJBrás, 3/TES (S) 43)
Quando nos morre alguém muito querido, é salutar e consolador, recordar as suas últimas palavras, as suas recomendações, as suas últimas vontades.
Nesta ordem de ideias há, também, quem registe e guarde, as primeiras alocuções de algum momento significativo, que podem, de certo modo, mostrar a grandeza da rampa de lançamento na vida daquele nosso ente querido.
No caso do Padre Brás, para além do dia da sua Ordenação e Missa Nova, podemos tomar como momento significativo, também a sua entrada, como pároco, na primeira e única freguesia que paroquiou – a freguesia das Donas – próxima do Fundão. Na celebração da Missa desse dia, ficou registada e célebre a sua homilia, pelos ensinamentos e desafios que comporta, e que nos revelam muito do seu perfil humano e sacerdotal.
No tocante ao perfil humano, vejamos a sua humildade, generosidade e amizade: O Padre Brás revelou-se, desde logo, um homem profundamente humilde e, por isso mesmo, agradecido, generoso e amigo, como quem deseja retribuir “amor com amor”. Estas suas palavras o atestam:
[Queridos paroquianos]…quero agradecer-vos, profundamente reconhecido, a maneira carinhosa e entusiástica com que recebeste o que vem ser vosso Pároco… Sendo eu um Padre que apenas há dois dias deixei os bancos do Seminário, sem qualidades, sem dotes alguns, não posso convencer-me de que o vosso acolhimento tão benévolo é dirigido à minha pessoa. Tenho que o atribuir ao enviado de Deus junto de vós, ao Ministro de Jesus Cristo, que embora indigníssimo, por pura misericórdia Sua, o escolheu para a elevada dignidade de Sacerdote… E se vós assim vedes no padre o representante de Deus, posso, evidentemente, contar convosco, certo de que vós estareis sempre ao meu lado para me auxiliardes no que disser respeito à honra e glória de Deus e bem da Santa Igreja e em tudo o que disser respeito ao bem e santificação das almas.
Assim, também vos afirmo que podeis sempre contar comigo; que o vosso Pároco será sempre o vosso grande amigo, que estará sempre pronto para combater ao vosso lado, sobretudo contra os inimigos de vossas almas. A minha casa, não será uma casa de portas fechadas, para os habitantes desta freguesia, mas todos, todos, terão nela entrada e encontrar-me-ão sempre disposto e pronto a prestar-lhes os meus humildes serviços.
Caros leitores: ao escrever estas linhas, destaquei, como vedes, a expressão: A minha casa, não será uma casa de portas fechadas, mas todos, todos, terão nela entrada… Certamente recordam expressões idênticas a estas, pois creio que ainda ressoam aos nossos ouvidos, e aos de milhares de jovens que fortemente as aplaudiram, na JMJ 2023, em Lisboa, as palavras todos, todos, todos! E se estas palavras saídas da boca do Papa Francisco nos possam ter surpreendido, nestes tempos que são já de tanta abertura na Igreja, que dizer do facto das mesmas terem saído da boca do Padre Brás há, praticamente, um século, e a quarenta anos da concretização de um Concílio, que o Papa S. João XXIII quis promover, para abrir as janelas da Igreja a fim de a arejar e deixar entrar, em maior profusão, o vento do “Espírito que sopra onde quer?” Por isso, damos razão a um famoso escritor que disse que o Padre Brás andou cinquenta anos à frente do seu tempo.
Esta abertura do Padre Brás, posto que humana e natural, tinha também uma finalidade marcadamente apostólica: conhecer os paroquianos, ganhar-lhes a confiança, despertá-los para idêntica e recíproca abertura. Deste modo, em pouco tempo, ele conseguiu que eles igualmente lhe abrissem a porta das suas casas, onde ia visitá-los, rezar o terço em família com eles, realizar todo um trabalho personalizado de evangelização familiar que lhe deu bases e asas para vir a ser o “Apóstolo da Família em Portugal”, como foi designado. Preocupando-se com todos os membros da família, fazia, no entanto, incidir sobre os pais a sua maior atuação, certo de que eram eles os timoneiros daquela pequenina “barca” que havia que conduzir, sã e salva, ao porto da salvação. Por isso, logo na sua primeira alocução, lhes dizia: Saúdo-vos, pais e mães de família, que tendes sobre os vossos ombros o pesadíssimo ónus da educação de vossos filhos. Ah! Eu desejava, ardentemente, possuir ciência e experiência para sábia e eficazmente vos dirigir, vos aconselhar e guiar a fim de fazer de cada um de vós, exímios educadores e pais modelares que, educando os vossos filhos com a palavra e, principalmente com o exemplo, fizésseis deles cristãos acima do vulgar, almas todas de Deus. E, se assim fosse, como viveríeis felizes, vós e os vossos filhos! Nos vossos lares haveria um acrisolado e mútuo amor, uma paz, uma harmonia, uma felicidade que seria o prenúncio dessa felicidade de que gozam os bem-aventurados no Céu.
Queria, o Servo de Deus, fazer de cada um dos pais, “exímios educadores”, mas quem o conheceu pode afirmar que ele próprio foi exímio educador, sábio conselheiro e eficaz pedagogo. Dotado de grande capacidade de observação atenção, perspicácia e interação, a sua pedagogia, essencialmente prática e motivadora, era multifacetada, porquanto ele ensinava tudo, desde as coisas mais básicas e elementares, às mais elevadas, relativamente ao público-alvo. Com a convicção de que “mais vale prevenir que remediar”, usava muito o método preventivo. Neste ponto, recordo que um dia ao visitar as aulas de preparação de pessoas adultas para a quarta classe, ele, entre outras coisas, recomendava: “Olha, na aula de Português, faz todos os possíveis para evitar que as alunas deem erros, porque, se começarem a escrever uma palavra de forma errada, é muito mais difícil depois corrigirem-na”. E o mesmo insistia com as agentes da pastoral: “Façam tudo, tudo, para ajudar as jovens a desviarem-se dos perigos imorais, para evitar que caiam no mal, porque depois da primeira queda, é muito fácil, caírem segunda vez e assim sucessivamente”.
Depois disto, penso que todos concordamos que esta homilia do Padre Brás continua atual, e que todos, mas especialmente as famílias, e concretamente os pais, muito poderão beneficiar ao tomar para si, estes ensinamentos.
Conceição Brites – Cooperadora da Família
Artigo da edição agosto/setembro de 2014 do Jornal da Família